Os desafios para o enfrentamento à seca nordestina: a segurança hídrica como peça-chave para o bem-estar social.
- Lorruan Alves
- 14 de jun.
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Atualizado: 14 de jun.
A segurança hídrica é um tema de grande importância no Brasil, devido à desigualdade de distribuição da água e os recorrentes efeitos das mudanças climáticas. No contexto nordestino, as mudanças climáticas são bem mais avassaladoras, principalmente em áreas semiárido que, decorrente das mudanças climáticas estão se tornando cada vez mais secas e com risco de desertificação.
É perceptível que a gravidade da seca não é recente. Basta lembrar da grande seca da década de 1970, que deixou um rastro de fome, sede, migração forçada e miséria no sertão nordestino. Milhares de famílias foram obrigadas a abandonar suas terras, fugindo da escassez de água, das lavouras secas e dos animais mortos. As consequências foram tão severas que muitos se deslocaram para capitais do Sudeste, tornando-se parte do fenômeno do êxodo rural.

Durante esse período, surgiram os chamados “campos de concentração”, locais improvisados pelo governo para reunir os retirantes e, assim, tentar controlar o fluxo migratório. No entanto, esses espaços, longe de oferecerem dignidade, expunham a população à fome, a doenças e a condições de trabalho precárias, evidenciando não só a crise climática da época, mas também o descaso social e político que historicamente marcou a relação do poder com o sertão.
Além disso, a seca da década de 1970 reforçou a chamada “indústria da seca”, um termo que simboliza como determinados grupos políticos e econômicos se beneficiavam da miséria da população, perpetuando práticas clientelistas baseadas na dependência de soluções emergenciais, como os carros-pipa, as frentes de trabalho e as esmolas distribuídas em troca de apoio político. A seca também escancarou uma realidade que, infelizmente, se repete: a velha lógica da “indústria da seca”. Isso significa que, enquanto uma parte da população sofria com a fome e a sede, outra lucrava com essa miséria. Políticos e empresários se aproveitavam da dependência dos mais pobres, oferecendo ajuda paliativa — como carros-pipa e frentes de trabalho — em troca de apoio político e submissão. O mais triste é perceber que, mesmo após tanto tempo, esse problema persiste. As soluções até surgem, como a construção de cisternas, projetos de transposição e outras iniciativas, mas ainda são insuficientes diante da gravidade da situação. E o futuro não parece mais generoso: as mudanças climáticas vêm tornando as secas mais longas, mais intensas e mais frequentes, aumentando não só o sofrimento de quem vive no semiárido, mas também colocando em xeque a capacidade da região de se manter habitável e produtiva.
Com o passar dos anos, foram surgindo políticas públicas voltadas para garantir a segurança hídrica. Ao abordar esse tipo de iniciativa, é indispensável destacar a transposição do Rio São Francisco, considerada a maior obra de deslocamento de águas do país. Embora sua execução seja relativamente recente, a ideia surgiu ainda no período do Segundo Reinado, durante o Brasil Imperial. Na época, o imperador Dom Pedro II, sensibilizado pelos efeitos devastadores das secas que assolavam o sertão, chegou a elaborar um projeto com o objetivo de assegurar a segurança hídrica para o povo nordestino. No entanto, essa proposta não saiu do papel naquele período. A ideia voltou a ser discutida após a Proclamação da República, durante a República Velha e nas décadas seguintes. Contudo, foi apenas em 2005, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que a obra teve início de forma efetiva. Apesar dos avanços, a transposição enfrentou diversas paralisações e demorou anos para ser concluída. Posteriormente, os trechos pendentes foram acelerados e finalizados durante a gestão do governo de Jair Bolsonaro (2019–2022), resultando na conclusão da obra.
Apesar da evolução de políticas públicas, desafios ambientais como a degradação do meio ambiente com o desmatamento e o manejo inadequado de água, também, o baixo uso das tecnologias sustentáveis.
As tecnologias sustentáveis podem ser a peça-chave para o combate da falta de água no Nordeste, tecnologias essas que já foram aplicadas em outros países a fora, a exemplo disso, Israel é exemplo em gestão hídrica, levando em conta que Israel não tem muitos rios e reservas de água doce, mas mesmo assim, garante o acesso a água para a população.

Israel construiu grandes usinas de dessalinização da água do mar, que torna a água salgada em água potável, eles reutilizam às águas do esgoto de maneira inteligente, utilizando para a irrigação das plantações, tratando boa parte das águas residuais e sendo utilizada para potencializar a agricultura, além disso, mesmo em regiões com baixo índices de chuva, Israel tem uma estrutura moderna de captação e armazenamento de água, fazendo um reaproveitamento da água da chuva. Tendo em vista os fatos apresentados, as propostas de intervenção que devem ser propostas não podem se resumir em construir uma maior estrutura tecnológica para enfrentar a escassez de água, mas sim garantir a integração das pessoas e engajar elas no assunto, por isso, é importante que o governo federal promova palestras de conscientização com o intuito de ensinar as pessoas a fazer um uso consciente da água, evitando desperdícios, conjuntamente com o fortalecimento da educação ambiental, não sendo abordada de maneira superficial e pontual mas de maneira regional, trabalhando as questões ambientais de maneira contínua não só de maneira teórica, mas com atividades práticas interdisciplinares como a criação de hortas, compostagem e o ensino da reutilização correta da água.
Dessa maneira, é perceptível que garantir a segurança hídrica não depende unicamente de intervenções isoladas por parte do governo, mas sim de um esforço coletivo, que envolve toda a conjuntura social — desde a atuação do poder público até o engajamento da sociedade civil, empresas e organizações. Afinal, a crise hídrica não é um problema pontual, e sim uma questão estrutural, que exige planejamento contínuo, ações integradas e uma mudança na forma como a água é percebida e utilizada.
Sob esse viés, torna-se evidente a necessidade da criação de um Ministério da Segurança Hídrica, um órgão específico e especializado, capaz de coordenar de forma eficiente as políticas públicas voltadas para a gestão dos recursos hídricos. Esse ministério teria como função principal alinhar a implementação de tecnologias sustentáveis — como o reaproveitamento da água, a dessalinização e a captação de água da chuva — com práticas de gestão que sejam eficientes, transparentes e socialmente responsáveis. A atuação desse órgão não se limitaria apenas à gestão direta da água, mas também incluiria ações educativas, campanhas de conscientização sobre o uso racional da água e incentivo a práticas sustentáveis, tanto na zona urbana quanto na rural. Assim, haveria uma construção de uma cultura voltada para a preservação, conservação e uso inteligente dos recursos hídricos.
Portanto, ao adotar essa proposta, haveria um fortalecimento significativo das medidas voltadas para assegurar a segurança hídrica, especialmente nas regiões que historicamente enfrentam escassez, como o Nordeste brasileiro. Consequentemente, isso não apenas garantiria o acesso contínuo e seguro à água, mas também promoveria diretamente o bem-estar, a dignidade e a melhoria da qualidade de vida do povo nordestino, contribuindo para o desenvolvimento social, econômico e ambiental da região de forma sustentável e duradoura.
"É preciso lembrar que ninguém escolhe o ventre, a localização geográfica, a condição socioeconômica e a condição cultural para nascer. Nasce onde o acaso determinar. Por isso, temos que cuidar de todos aqueles que estão em todos os recantos deste planeta." Azis Ab'saber - geógrafo brasileiro.
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